Transformadas em princesas no fenótipo, as mulheres guardam no genótipo o segredo inconfessável de que, na verdade, são sapos. O elixir da juventude foi encontrado nos consultórios, hospitais e clínicas estéticas, onde a mulher torna-se uma réplica perfeita de milhares de outras, eternamente “jovens”.
A ficção do belo, dócil e sedutor corpo feminino serve de suporte ideológico a todas as práticas da cultura, tais como a economia, a propaganda, a medicina, a indústria audiovisual, a política e a religião. A mulher moderna, tão orgulhosa de suas conquistas através dos séculos, continua a sua milenar saga de submissão.
Ao longo da História, padrões de beleza lhe foram impostos. Na Europa renascentista foram as formas carnudas e voluptuosas; no Japão dos samurais (794 a 1185), belos eram os dentes tintos de preto, a alva pele e os longuíssimos cabelos sedosos. Na antiga literatura chinesa, a beleza era esguia, frágil e perversa. Nos últimos mil anos, dois biliões de chinesas mutilaram seus pés para torná-los minúsculos. Quando crianças quebravam os ossos e os enfaixavam, dobrando para dentro os dedos para que não crescessem. Sinónimo de graça e leveza, o culto aos “pés de lírio” só foi abandonado após a decadência da Dinastia Ch’ing, no início do século 20.
No advento da Revolução Industrial, no século 19, a mulher transformou-se em produto para as indústrias de cosméticos, estética e cirurgia plástica. Já no Ocidente, após a Segunda Guerra Mundial, belas eram as mulheres roliças, à moda da Renascença – modelo substituído pela longilínea modelo Twiggy, na Inglaterra dos anos sessenta.
Na era da TV, do cinema e do Photoshop, o padrão de beleza uniformizou-se e foi difundido às massas. As revistas vendem milhares de cópias de modelos e artistas – todas iguais. A deputada Valerie Boyer apresentou ao parlamento francês, em Setembro de 2009, um projecto de lei que obriga jornais, revistas e sites a identificar imagens modificadas no Photoshop, com os dizeres: “Esta imagem foi modificada digitalmente e pode não corresponder à realidade”. Ela argumenta que a popularização do recurso cria referências de beleza e estética inatingíveis no mundo real.
A ditadura imposta pela mídia é um factor essencial para o controle da sexualidade feminina. A visão simplista da relação existente entre beleza física e sexualidade leva à exploração dos atributos relacionados a ela, como o tamanho dos seios, coxas, glúteos, lábios e cor dos cabelos – elementos utilizados para avaliar o ser sexual. A sexualidade é removida do mundo privado tornando-se pública, sujeita à definição, inspecção e controle social.
O mito da beleza feminina oculta a rica diversidade humana. Seus criadores retiram tudo o que se relaciona à subjetividade ou à experiência específica do indivíduo, privando-o de sua história pessoal. A eficácia é indiscutível. Lamentável é saber que o ser humano, no caso a mulher, é infinitamente mais do que estabelece a mídia. Bom seria se um beijo amoroso pudesse transformar as princesas virtuais em sapos que, pelo menos, são de verdade.