Artigo de opinião | Margarida Nogueira
Muitos pensam que nós, feministas, achamos que todos os elogios são um assédio, o que não é verdade. Mas a definição também não é simples para nós. Normalmente a maioria das feministas deixa o veredicto para a vítima. Se a pessoa se sentiu assediada, então foi assédio.
Em seguida é essencial que o relato da vítima seja levado a sério e sempre em primeiro lugar, mas o problema é que muitas vezes a própria pessoa não sabe classificar o que aconteceu, não quer acreditar que foi assediada, ou não se sente confortável ao fazer essa afirmação. Além disso, deixar o veredicto para cada indivíduo torna a situação muito arbitrária e difícil de ser explicada ou ensinada. E já que a educação é essencial para um mundo sem machismo no futuro, que tal tentar definir o que é um assédio sexual?
Pois bem creio que devemos separar dois pontos: o assédio sexual e um (bom) elogio.
É assédio moral, sim! Falando por experiência própria, é difícil encontrar uma mulher que não tenha passado pelo constrangimento de se sentir invadida de forma verbal ou mesmo de forma concreta por um desconhecido. É tão comum sermos assediadas que chega a parecer inevitável e esperado, porém, certos elogios não fazem com que uma mulher se sinta mais bonita, sim desvalorizada e mesmo agredida.
Parece inofensivo num primeiro momento, mas a intenção não é iniciar um relacionamento e sim de tratar a mulher como se fosse um objecto. Podem ser olhares, assobios, palavras de calão, comentários sobre o corpo, pedidos invasivos, gestos e mesmo tocar ou apalpar nosso corpo sem consentimento, que fazem com que ao invés de nos sentirmos lisonjeadas – como pensam alguns – sentimo-nos é violadas e agredidas, pois violam a intimidade a que todas temos direito.
É ainda corriqueiro que, quando a mulher não corresponde ao assédio, acabe por ouvir ainda mais agressões, e é por isso que muitas vezes não são capazes de responder ás injúrias sofridas. O sentimento descrito pelas vítimas é de vulnerabilidade, vergonha, constrangimento e ainda medo pela sua integridade física. Muitas passam a reflectir se tiveram responsabilidade pelo comportamento do outro.
É comum procurarem em si mesmas algo que justifique: será que a roupa é curta ou justa demais? É por que estou a usar um decote? Estava a caminhar de forma provocativa? É porque estou a passear sozinha á noite? Estes meros pensamentos já são uma forma de violência contra a mulher. É a famosa cultura da violação, que enfatiza a culpa da vítima pelo abuso inadmissível pelo qual passam e que é absorvido pelas próprias mulheres, que passam a evitar determinados contextos e atitudes como se os espaços públicos fossem dos agressores e tivessem que respeitá-lo para não sofrer as consequências.
No entanto, um elogio pode fazer muita diferença na auto-estima de uma mulher, sendo que deve ficar claro que há uma linha entre o elogio e a violação da intimidade. Um elogio é um discurso em louvor de alguém, ou seja é um enaltecimento para glorificar uma pessoa. Um elogio tem sempre boas intenções, nunca pretende ser constrangedor ou intimidar, mas mesmo se a intenção for positiva, elogios inapropriados, com referências à aparência física ou conotação sexual, ou mesmo em situações fora da intimidade são considerados assédio.
A nossa cultura favorece o sexo fácil e atitudes vulgares, sendo esse o tipo de comportamento e ideias que no no quotidiano propagam a desigualdade entre os sexos. Faltam campanhas para alertar que frases e actos obscenos contra a mulher são crimes, e que as vítimas devem denunciar. É preciso compreender que esse é um comportamento ensinado e por isso a educação deve vir de casa e dos modelos que uma criança tem na sua vivência. .
Imagens: divulgação . Assédio sexual ou simplesmente um elogio?
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